Fim de verão

 

Aviso: texto que pode conter vestígios de neorrealismo

 

Com a promessa de um fim de semana solarengo, rumamos ao Oeste na esperança de um último dia de praia da temporada. Chegados, as nuvens já ameaçavam no horizonte.

Com o avançar da tarde, desceram à terra e ao mar, adensando-se o nevoeiro, baixou a temperatura, e nem as gaivotas, seres alados e destemidos que enfrentam o vento Atlântico como ninguém, se atreveram a avançar para o mar escondido.

Não apanhamos sol e muito menos tomamos banho, mas a beleza e as memórias compensaram largamente a desilusão.

 

Memórias do "tempo em que festejavam o dia dos meus anos" e as temporadas estivais de praia se passavam, em família, no Oeste. Então, como hoje, os nevoeiros também se abatiam inesperadamente, obrigando-nos a tomar abrigo na barraca de lona às listas. Jogavam-se jogos em família sobre a areia fria, ao abrigo da humidade.

 

Quando o nevoeiro persistia até ao anoitecer, a sirene do farol rompia em uivos monocórdicos intermitentes, única forma de avisar do perigo as traineiras incautas. Eu imaginava pescadores corajosas a enfrentar o mar às cegas, na iminência de um naufrágio que nunca chegava a acontecer. Ao outro dia estava sol e o peixe fresco brilhava à venda na lota.

 

No regresso, a Batalha, imponente exemplar Gótico da Portugalidade. Hoje, como então, as colunas das capelas imperfeitas continuam, decepadas, a apontar para o céu.

 

Lisboa, 7 de dezembro de 2020